29-11-2014 – Falta de especialistas em Medicina Interna prejudica assistência aos doentes



Nota de Imprensa 29/11/2014

 

Falta de especialistas em Medicina Interna prejudica assistência aos doentes

 

Após várias tentativas para acordar soluções que minimizem a falta de médicos especialistas de Medicina Interna, o Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos (CRNOM) vê-se forçado a denunciar a situação que se vive no Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro (CHTMAD), onde médicos especialistas de Medicina Interna acumulam dias de urgências e horas extraordinárias para lá do admissível. Um excesso de trabalho que não só compromete as boas práticas médicas, como pode prejudicar de forma significa a assistência prestada aos utentes que recorrem às diversas unidades deste centro hospitalar.

Caracterização do Centro Hospitalar
O CHTMAD, classificado como hospital central, tem uma área de influência directa de 270 mil habitantes (130 mil habitantes no concelho de Vila Real, 70 mil habitantes no de Chaves e 70 mil habitantes no de Lamego) e uma elevada prevalência de população idosa, estimando-se que 42% das pessoas tenham idades acima dos 50 anos e 26% acima dos 65 anos.

O hospital de Vila Real tem uma urgência polivalente, o hospital de Chaves tem uma urgência médico-cirúrgica e o hospital de Lamego tem uma urgência básica.

O serviço de Medicina Interna do CHTMAD é constituído por um total de 26 médicos especialistas e apresenta um volume total anual de 8.000 internamentos e 19.000 consultas (dados relativos ao ano de 2013).

A Unidade de Vila Real tem a seu cargo 72 camas de internamento e 12 camas na unidade de AVC, a Unidade de Chaves 67 camas, a Unidade de Lamego 30 a 36 camas e a Unidade do Peso da Régua 12 camas adstritas a uma unidade básica de internamento sob supervisão de um médico de Clínica Geral em colaboração com um médico especialista de Medicina Interna da Unidade de Vila Real.

O serviço de Medicina Interna do CHTMAD tem ainda a seu cargo a Unidade de Cuidados Paliativos de Vila Pouca de Aguiar com um total de 12 camas e uma média de 200 internamentos/ano cuja médica especialista responsável exerce a sua actividade assistencial quando cessa as suas funções na Unidade de Vila Real e em regime de prevenção das 18-24 horas.


Recursos Humanos

De acordo com o relatório publicado pela ACSS em 2011 o serviço de Medicina Interna do CHTMAD deveria ser constituído por 55 a 57 médicos especialistas em Medicina Interna (com horário de 40 horas por semana), sendo aceitável que no máximo até 25% daqueles médicos possam ser internos em formação específica na especialidade de Medicina Interna.

O serviço de Medicina Interna do CHTMAD apresenta na Unidade de Lamego 3 médicos especialistas, na Unidade de Vila Real 14 médicos especialistas e 8 internos em formação específica, e na Unidade de Chaves 9 médicos especialistas e 5 internos em formação específica.
Atendendo à realidade do serviço de Medicina Interna do CHTMAD, este serviço apresenta um défice estimado de cerca de 18 médicos especialistas em Medicina Interna dada a sua área de influência.

Neste momento, um médico de Medicina Interna trabalha em média 60-70 horas por semana e realiza 80-100 horas extraordinárias/mês, o que ultrapassa claramente os limites máximos da duração de trabalho semanal (40 horas) e representa uma carga horária inaceitável em horas extraordinárias se atendermos ao número máximo de horas consagradas na legislação aplicável (incluindo trabalho suplementar num período de referência de 6 meses).
Actualmente, e desde há vários meses e alguns anos no caso de Chaves, o serviço de Medicina Interna do CHTMAD tem prestado a sua actividade assistencial de forma altamente deficitária em termos de recursos humanos, nomeadamente com recurso a múltiplas horas extraordinárias destes profissionais de saúde para assegurar as várias escalas de urgência.

A título de exemplo, e no mês de Novembro, os 3 médicos especialistas de Medicina Interna da Unidade de Lamego estão escalados em média 24 dias (em 30) de urgência o que pode comprometer de forma grave e inaceitável a qualidade assistencial necessária aos doentes que recorrem ao serviço de urgência, aos doentes internados naquela Unidade e aos doentes agendados para a consulta externa.

Na Unidade de Chaves a média de doentes internados por médico especialista é de cerca de 10-17, o que pode comprometer de forma grave a qualidade de cuidados prestados a estes doentes.

Por sua vez, na Unidade de Vila Real, os seus médicos são frequentemente deslocados para prestar actividade assistencial de urgência nas restantes Unidades com o prejuízo inerente ao seguimento dos doentes internados nesta Unidade e aos doentes da consulta externa.
Importa salientar que muitas das escalas de serviço de urgência só são possíveis de assegurar com recurso aos internos de formação específica em Medicina Interna, o que, dado o elevado número de horas em serviço de urgência a que são alocados sistematicamente, pode comprometer a sua formação específica.

No último ano, o serviço de Medicina Interna perdeu 3 especialistas (um por reforma, outro por transferência autorizada e outro por rescisão de contrato).


Procura de soluções

A direcção do serviço de Medicina Interna do CHTMAD apresentou à direcção clínica várias propostas para tentar colmatar as lacunas existentes no funcionamento das várias Unidades e que passam inevitavelmente pela necessidade de contratação de, pelo menos, 7 médicos especialistas de Medicina Interna no imediato.

Até ao presente momento, a direcção do CHTMAD não apresentou e discutiu um plano sustentável para solucionar a situação existente e o director do serviço de Medicina Interna já apresentou a sua demissão.

A decisão mais recente da direcção do CHTMAD foi a de suspender unilateralmente o plano de férias para o mês de Dezembro de todos os médicos de Medicina Interna (especialistas e internos) da Unidade de Vila Real contrariando todas as regras habitualmente aplicáveis. Sem qualquer consideração por quem já dá e deu muito de si ao longo de todos estes anos.

Adicionalmente, estão disponíveis 3 jovens especialistas de Medicina Interna recém-formados no CHTMAD e nada foi feito até ao momento pela direcção do CH para garantir a sua contratação.

E entretanto, assistimos de forma incompreensível à existência de concursos e contratações a decorrer em simultâneo, com princípios contraditórios que não salvaguardam as necessidades das zonas mais carenciadas.

Exemplo desta realidade são as contratações nominais directas para ocupar vagas de especialidades que estão abertas no concurso regional fechado em vigor.

O Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos não pode deixar de condenar de forma veemente a direcção do CHTMAD por:

1. Ser responsável em manter uma situação que não garante a segurança e qualidade assistencial aos seus cidadãos e potenciais doentes, violando direitos constitucionalmente consagrados e colocando em risco a saúde dos doentes;

2. Ofender a relação de confiança com os seus profissionais de saúde não os tratando como pessoas mas apenas como números, como é notório nas escalas elaboradas para o serviço de urgência e no não cumprimento das medidas acordadas, nas diversas reuniões realizadas com os médicos, no sentido de minimizar o problema dos recursos humanos;

3. Não respeitar a legislação vigente relativa ao trabalho médico e violar de forma reiterada os limites impostos pelas boas práticas médicas, escalando abusivamente os médicos para realizarem serviço de urgência e debilitando os cuidados médicos em regime de internamento e consulta externa;

4. Não estar a ser respeitado integralmente o programa de formação médica especializada dos 13 médicos internos de Medicina Interna do CHTMAD.
O Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos, sem prejuízo de outras medidas que venha a tomar, e após fracassados os contactos com a direcção clínica do CHTMAD, e em defesa dos doentes e das boas práticas médicas, comunicou com carácter de urgência todas as deficiências existentes ao Ministro da Saúde, ao Bastonário da Ordem dos Médicos, à ARS Norte, à Entidade Reguladora da Saúde, à direcção do Colégio de Especialidade de Medicina Interna e aos Sindicatos Médicos.

Adicionalmente apoiará com firmeza, e no limite das suas competências, todas as medidas que os médicos de Medicina Interna entendam levar a cabo no plano jurídico em defesa dos seus direitos.

Não podemos nem devemos pactuar com o silêncio prolongado dos responsáveis do CHTMAD perante a transgressão dos direitos das pessoas (doentes e médicos).


O Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos
Porto, 29 de Novembro de 2014